Hoje, celebramos o vigésimo Dia da Visibilidade Trans no Brasil, uma ocasião marcada por reflexões profundas e compromissos que precisam ser renovados diante das complexidades que a comunidade trans enfrenta. Ao alcançarmos o ano de 2024, somos confrontadas com a dura realidade de sermos, pelo 15º ano consecutivo, o país que mais assassinou pessoas trans em todo o mundo (ANTRA, 2024). Essa estatística alarmante nos convoca a unir forças e redobrar nossos esforços na luta contra a transfobia e a violência.
É fundamental reconhecer a interseccionalidade entre a transfobia e o racismo, especialmente quando se trata de jovens entre 15 e 29 anos, travestis e mulheres trans negras, muitas das quais também são profissionais do sexo. Essa comunidade enfrenta não apenas a discriminação de gênero, mas também as camadas adicionais de preconceito racial e social, aumentando sua vulnerabilidade socioeconômica e empurrando muites para a pobreza. (ANTRA, 2024; Pereira & Gomes, 2017).
Em meio a esses desafios, não podemos ignorar o índice alarmante de tentativas de suicídio nessa população, alcançando 41%, em contraste gritante com a média de 1,6% na população em geral (IBDFAM, 2024). Isso nos obriga a refletir sobre as condições sociais que contribuem para essa estatística, destacando a urgência de criar um ambiente mais inclusivo e acolhedor. Também nos faz perceber a relação de insegurança vivida por pessoas trans e travestigêneres dentro do ambiente escolar.
Nesse Dia da Visibilidade Trans, é imperativo destacar a promoção do respeito e reconhecimento da identidade de gênero da comunidade trans. O uso do nome social, o emprego do pronome de tratamento adequado e a garantia de acesso a espaços segregados por gênero são passos significativos na construção de uma sociedade mais justa e inclusiva. Particularmente, advogo até mesmo para que ignoremos a demora e a espera por leis e regulamentações que protejam a população travestigênere no espaço de educação. Não aceitamos o racismo, pelo contrário, o repudiamos. Não toleramos homofobia e lesbofobia, as combatemos. Mas e a transfobia? Fechamos nossos olhos e aceitamos que ela existe e que estamos de mão atadas? O que isso significa para as populações que estamos educando?
Inclusive, vou além! No que a transfobia afeta pessoas cis, em especial mulheres cis pretas? Não são poucos os casos que vêm surgindo nas redes sociais de mulheres cis negras sendo “transivestigadas” ou, em outras palavras, sendo questionadas sobre suas genitálias a fim de poderem usar espaços segregados por gênero. Em Pernambuco, 2023, tivemos um caso de transfobia cometido contra uma mulher cis que levou um murro em um restaurante.
Apesar de todos esses desafios, ainda encontramos motivos para celebrar. Sem esperança de mudança, não faria sentido celebrar o dia de hoje. Mas, o que então celebramos, em meio a todas essas mazelas mencionadas?
Celebramos a resiliência das travestis que enfrentam a adversidade cotidiana. Celebramos os homens trans que não apenas existem, mas também educam e inspiram. Celebramos as mulheres trans que dedicam suas vidas à educação e ao ativismo. E celebramos as pessoas não-binárias que, mesmo diante das adversidades, resistem e prosperam.
Neste Dia da Visibilidade Trans, em 2024, que possamos mais que nunca, nos comprometer a continuar lutando por um futuro onde a equidade de gênero seja uma realidade para todos, onde a diversidade seja celebrada e onde cada indivíduo possa viver plenamente, respeitado em sua identidade única. Que esta celebração seja não apenas um momento de reflexão, mas também um catalisador para ações concretas e positivas em direção a um mundo mais inclusivo e justo.
ANICO PERFLER, TRAVESTI, EDUCADORA E RESISTÊNCIA.
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